segunda-feira, 2 de julho de 2012

" A Falta Que Me Ama " - Carlos Drummond de Andrade

Entre areia, sol e grama
o que se esquiva se dá,
enquanto a falta que ama
procura alguém que não há.
Está coberto por terra,
forrado de esquecimento.
Onde a vista mais se aferra,
a dália é toda cimento.
A transparência da hora
corrói ângulos obscuros:
cantiga que não implora
nem ri, patinando muros.
Já nem se escuta a poeira
que o gesto espelha no chão.
A vida conta-se, inteira,
em letra de conclusão.
Por que é que revoa à toa
o pensamento, na luz?
E por que nunca escoa
o tempo, chega sem pus ?
O inseto petrificado
na concha ardente do dia
une o tédio do passado
a uma futura energia.
No solo vira semente ?
Vai tudo recomeçar ?
É a falta ou ele que sente
o sonho do verbo amar ?